Relatório mensal: Abrindo espaço para queda de juros

Equipe econômica do C6 Bank, liderada por Felipe Salles, divulga projeções

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C6 Bank Felipe Salles Foto: Germano Lüders 04/08/2021

A equipe econômica do C6 Bank, liderada por Felipe Salles, divulgou nesta quinta-feira (13) mais uma edição do seu relatório macroeconômico. Confira, abaixo, a íntegra do documento:

Resumo

Internacional

A economia global segue em um momento de incerteza, depois da quebra de dois bancos regionais nos Estados Unidos no início de março. Existem sinais de que a crise foi contida, mas ainda é cedo para garantir que a questão está resolvida. O impacto sobre as economias ainda não está claro, o que deve manter os bancos centrais cautelosos, com movimentos suaves nas decisões de juros por ora.

A economia americana dá sinais de perda de fôlego, depois de seguidos aumentos de juros por parte do banco central americano (Federal Reserve – Fed). A inflação segue alta, mas com composição heterogênea e desacelerando: preços de bens recuaram, mas serviços seguem pressionados. O mercado de trabalho continua aquecido, com a taxa de desemprego próxima do menor nível desde 1970, em 3,5%. O Fed elevou a taxa de juros em 25 pontos-base em março e indicou possibilidade de mais aumentos. Nossa expectativa é de mais uma alta de 25 pontos-base na reunião de maio. Não prevemos cortes nos juros até meados de 2024. Reconhecemos, no entanto, que caso haja um aperto de crédito mais intenso decorrente do colapso de alguns bancos regionais, o início do corte de juros pode ser antecipado.

Na área do euro, a crise energética arrefeceu, com acesso a fontes alternativas de energia, estoques de gás natural elevados e temperatura mais amena no inverno. O Banco Central Europeu (BCE) subiu os juros em 50 pontos-base na reunião de março e reforçou que próximas decisões serão dependentes de dados. No Reino Unido, a inflação segue elevada, em dois dígitos, e o Banco da Inglaterra segue com o ciclo de aumento de juros.

a China, a atividade tem ganhado força depois da melhora do quadro de Covid-19. Investimentos aumentaram, o crédito expandiu e o setor imobiliário deu sinais incipientes de melhora. A inflação segue baixa, apesar da retomada na atividade, em razão de uma demanda contida decorrente de um mercado de trabalho ainda fraco.

Brasil

A economia apresentou um bom desempenho no ano passado: alta de 2,9%.  No entanto, as condições que possibilitaram o sólido crescimento na primeira metade de 2022 já não estão mais presentes. Os dados de atividade mostram sinais de enfraquecimento, mas menos intenso do que o esperado. Para este ano, revisamos nossa projeção de crescimento do PIB de 1% para 1,5%. Para 2024, revisamos a projeção de crescimento do PIB de 0,5% para 1%, devido à redução antecipada da Selic.

O resultado primário do setor público consolidado encerrou o ano de 2022 com um superávit de 1,3%, influenciado por aumentos temporários da receita. Neste ano, devemos voltar a ter déficit primário. Revisamos nossa previsão de déficit para o setor público consolidado para 2023 de 1,4% para 1%, incorporando parte das medidas fiscais anunciadas pelo governo.  Pelo mesmo motivo alteramos nossa projeção para 2024, que passou de déficit de 1,2% do PIB para déficit de 0,7% do PIB.

Em nossa visão, a taxa de câmbio nos patamares atuais, historicamente elevados, reflete riscos fiscais. A taxa de câmbio possui forte correlação com a dívida líquida do setor público. Acreditamos que a piora da trajetória da dívida líquida do governo e a perspectiva de queda antecipada da Selic devem sustentar a depreciação do real. No entanto, a perspectiva de um dólar um pouco mais fraco globalmente do que o projetado anteriormente nos fez revisar a taxa de câmbio para o final deste ano de R$ 5,60 para R$ 5,30. Para frente, a taxa de câmbio deve continuar depreciando, influenciada principalmente pela elevação da dívida. Projetamos dólar em R$ 6 ao final de 2024.

A dinâmica inflacionária recente mostra queda do IPCA no acumulado em 12 meses, influenciada principalmente pela forte redução dos bens monitorados. Acreditamos que a inflação irá continuar alta e os preços livres devem desacelerar de forma gradual à frente. Para 2023, mantivemos nossa projeção de IPCA em 6%. Para 2024, esperamos que a inflação desacelere lentamente. Passamos a incorporar no cenário metas de inflação mais elevadas, de 4,5%, de 2024 em diante e com isso elevamos nossa projeção para o IPCA de 2024 de 5% para 5,5%. O Copom manteve a taxa Selic estável em 13,75% na reunião de março. Na nossa visão, a comunicação do Banco Central e o cenário prospectivo para a inflação sugerem uma queda da taxa Selic apenas a partir de 2024. No entanto, a expectativa de alteração da meta de inflação para 4,5% a partir de 2024 abre espaço para um corte de juros antecipado, a partir de setembro deste ano. Revisamos a projeção de Selic de 13,75% para 12,5% ao final de 2023. Para 2024, revisamos a projeção de Selic de 12% para 11% ao final do ano.

Panorama Global

EUA

Um mês depois do colapso de dois bancos regionais americanos, um contágio no sistema bancário parece ter sido evitado, depois de medidas tempestivas de órgãos reguladores. Nas duas últimas semanas, indicadores sugerem uma melhora da liquidez dos bancos: os depósitos bancários voltaram a subir e os pedidos de empréstimo dos bancos comerciais ao banco central americano (Federal Reserve – Fed) reduziram. Apesar desses sinais positivos, ainda é precipitado para dizer que o problema está resolvido. Mesmo que não haja um agravamento do quadro, o crédito pode se tornar mais escasso, com bancos reservando uma maior parte de seu capital para reduzir riscos de liquidez.

O Fed subiu juros em 25 pontos-base na decisão de política monetária no fim de março. O aumento foi menor do que o sugerido pelo presidente do Banco, Jerome Powell, em evento realizado antes da crise bancária, e ocorreu em um contexto de maior incerteza. A decisão elevou o intervalo de juros para 4,75% a 5% ao ano, o mais alto nível desde 2008. A alta foi justificada pela inflação elevada e mercado de trabalho aquecido. O Fed também sinalizou mais aumentos de juros à frente, a depender de dados. A ata da reunião indicou que membros falaram em possível aperto de crédito, em razão de desenvolvimentos no setor bancário, o que ajudaria a reduzir a pressão inflacionária, mas julgaram o efeito sobre a economia bastante incerto.

A indústria americana segue fraca. O índice de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês), divulgado pelo Instituto ISM, sinalizou atividade em contração na indústria nos últimos 5 meses. No mês de março, o índice indicou queda na demanda, mas leve melhora na produção e o emprego diminuiu indicando menos contratações no setor. O ISM para o setor de serviços ainda sinaliza expansão, porém mais moderada, com forte queda na demanda e desaceleração no emprego. 

O mercado de trabalho continuou forte. As contratações no mês de março se mantiveram bem acima da média de 2018-2019. A taxa de desemprego diminuiu de 3,6% para 3,5%, permanecendo próxima do menor nível da série histórica, apesar de um aumento na força de trabalho. A demanda por trabalho segue bem acima da oferta: observando a proporção de vagas abertas por desempregado, o número é de 1,7. Este desequilíbrio tem pressionado os salários. Acreditamos que o mercado de trabalho deve desaquecer lentamente.

A inflação desacelerou em março. O índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) subiu 0,1% no mês. O núcleo, que exclui alimentos e energia, subiu 0,4%, também desacelerando. Em 12 meses, a inflação segue alta, com núcleo subindo 5,6%, ainda elevado. A composição do índice mostra que os preços de bens continuam com baixa contribuição no indicador, enquanto os preços de serviços seguem pressionados. A boa notícia é que a inflação de aluguéis começou a perder força, mas a inflação de serviços em geral deve desacelerar lentamente, em razão de um mercado de trabalho aquecido.

Nossa expectativa é que a inflação continue desacelerando em razão da política monetária mais restritiva do Fed, mas que não volte à meta em um horizonte próximo. Mantemos nossa visão de que o Fed deve continuar com o ciclo de ajuste de juros, com mais um aumento de 25 pontos-base na próxima reunião de maio, levando a taxa para o intervalo de 5% a 5,25% ao ano, para então terminar o ciclo de alta de juros. Este aumento vem sendo sinalizado por membros da autoridade monetária e, na nossa visão, ajudaria a assegurar a desaceleração da inflação num contexto de demanda ainda forte. Não prevemos cortes nos juros até meados de 2024. Reconhecemos, no entanto, que, caso haja um aperto de crédito decorrente do colapso de alguns bancos regionais, o início do corte de juros pelo Fed pode ser antecipado.

O dólar vem perdendo força contra as demais moedas desde o início de março com turbulências no setor bancário local e a percepção por parte de investidores de um possível corte de juros por parte do Fed antes do sinalizado por membros do comitê de política monetária.  Em nossa visão, o dólar deve se estabilizar próximo aos valores atuais. Acreditamos que os juros elevados levem a uma desaceleração da economia americana, esfriando lentamente o mercado de trabalho, mas não a uma recessão.

Europa

A guerra entre Rússia e Ucrânia entrou no segundo ano. Mísseis russos continuam sendo lançados sobre várias cidades. A região leste da Ucrânia continua sendo a mais afetada. O presidente Putin anunciou que colocará armas nucleares na Belarus, escalando tensões e levando líderes da União Europeia a pensar em sanções contra o país. Nas últimas semanas, vêm ocorrendo encontros entre líderes mundiais, na tentativa de se buscar um fim para o conflito. O presidente chinês, Xi Jinping, esteve na Rússia para um encontro com Putin. Um plano de paz proposto pela China não ganhou apoio do Ocidente por não garantir a integralidade da Ucrânia. O presidente francês e a presidente da Comissão Europeia estiveram na China, pedindo mais apoio de Xi Jinping para o fim da guerra. Até o momento, poucos avanços foram alcançados. Esta semana, o presidente Lula está em Pequim. O acordo de exportação de grãos por portos ucranianos foi estendido. O conflito segue sem perspectiva de um fim próximo.

A crise de energia na Europa diminuiu, com estoques de gás natural elevados. Apesar do menor fornecimento russo desde meados do ano passado, importações de gás natural liquefeito têm mantido os estoques na região acima da média dos últimos 5 anos. A temperatura amena por mais tempo do que o usual também favoreceu a formação de estoques. O preço da commodity permanece abaixo da média de janeiro do ano passado, período anterior à guerra. No mercado internacional, o preço do petróleo subiu na margem e está ao redor de 85 dólares o barril, depois que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (OPEP+) anunciou um corte na produção da commodity a partir de maio. A redução anunciada é de 1,16 milhão de barris por dia até o fim de 2023. Apesar do aumento imediato nos preços, não esperamos uma pressão adicional, em razão de uma desaceleração no crescimento global em curso, provocada pelas taxas de juros elevadas em várias economias e a manutenção de um dólar em patamar ainda forte, que tende a reduzir o preço em dólar de produtos cotados na moeda americana.

A atividade melhorou em março, de acordo com os índices de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês). O índice composto, que inclui o setor de manufaturas e serviços, foi puxado por uma melhora forte no indicador de serviços, que subiu 2,3 pontos para 55, reforçando a expansão iniciada em janeiro. O PMI de manufaturas diminuiu, em 1,2 ponto, permanecendo em território contracionista em 47,3. Na composição do índice houve moderação na pressão de preços, que segue elevada, melhora no emprego e mais confiança no panorama da economia, apesar de preocupações com o setor bancário e aumento do custo de crédito.

O mercado de trabalho continua aquecido. A taxa de desemprego continuou em 6,6% em fevereiro, permanecendo no mínimo histórico da série iniciada em 1998.

A inflação continuou desacelerando. O índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) foi para 6,9% nos últimos doze meses até março contra 8,5% no período anterior, com queda no preço de energia. Apesar da desaceleração do índice cheio, o núcleo da inflação, que exclui alimentos e energia, segue forte e alcançou novo recorde de 5,7% no período.

O Banco Central Europeu (BCE) aumentou as taxas de juros em 50 pontos-base na reunião de março, elevando a taxa de depósito para 3% ao ano – maior nível desde 2008. Este foi o sexto aumento consecutivo e ocorreu apesar da maior incerteza em relação ao sistema bancário. Em comunicado, o Banco justificou o aumento em razão de uma inflação muito alta e que deve demorar a ceder. Acrescentou que o elevado nível de incerteza reforça a importância de os próximos passos serem dependentes dos dados. A presidente do Banco, Christine Lagarde, disse que tem confiança de que a inflação retorne à meta no médio prazo. Lagarde tem reforçado que as taxas de juros devem continuar sendo usadas como principal instrumento para estabilizar preços. Acreditamos que o BCE deva reduzir o ritmo de aumento dos juros a partir da próxima reunião em maio, em razão da maior incerteza na economia global. Em nossa visão, o BCE tem um longo caminho a percorrer e deve manter juros elevados por um período prolongado.

No Reino Unido, a inflação acelerou, permanecendo em dois dígitos (10,4% acumulada em 12 meses até fevereiro), impactada principalmente pelo aumento no preço de alimentos. O núcleo da inflação, que exclui energia e alimentos, também acelerou para 6,2%, com crescimento no preço de bens e serviços. O mercado de trabalho segue aquecido, com desemprego baixo e vagas em aberto elevadas.

O Banco da Inglaterra (BoE, na sigla em inglês) elevou a taxa de juros em 25 pontos-base, conforme esperado, para 4,25% ao ano – maior nível desde 2008. O aumento foi o décimo-primeiro consecutivo. O BoE justificou o aumento em razão da inflação elevada, bem acima da meta de 2%, e mercado de trabalho aquecido. Na ata da reunião, o Banco reforçou que mais aperto na política monetária pode ser necessário, se existirem evidências de pressão inflacionária persistente. Sobre a volatilidade recente relacionada ao setor bancário, o MPC avalia que o setor permanece resiliente na região.

China

A atividade continuou ganhando força em março, com a melhora do quadro de Covid-19 já no início do ano, depois do fim da política de Covid zero. De acordo com os índices de gerentes de compras (PMIs, na sigla em inglês), calculados pelo Escritório Nacional de Estatísticas chinês (NBS, na sigla em inglês), o PMI composto, que considera o setor de manufaturas, construção e serviços, continuou subindo e alcançou 57 pontos, maior nível em mais de uma década. O PMI de manufaturas diminuiu levemente para 51,9, mas continua indicando expansão. O PMI de serviços subiu 1,3 ponto para 56,9, sinalizando recuperação em diversos setores, principalmente turismo e varejo. A balança comercial teve forte superávit em março, com aumento sólido nas exportações tanto para economias desenvolvidas quanto emergentes.

O crédito expandiu mais que o esperado neste início de ano. No mês de março, a expansão foi puxada por empréstimos de médio e longo prazo às empresas e famílias, refletindo o impacto de políticas de crédito pró-crescimento, inclusive para o setor imobiliário, com a intenção de promover maior estabilidade no setor. O setor imobiliário tem dado sinais de melhora. Os investimentos no setor tiveram menor contração. As vendas de imóveis cresceram no início do ano e os preços de casas subiram levemente depois de 17 meses consecutivos de queda.

A inflação segue baixa, apesar da recuperação da atividade. A falta de estímulos do governo durante a pandemia e um mercado de trabalho ainda fraco, ajudam a conter a demanda, reduzindo a pressão sobre os preços.

O Banco do Povo da China (PBoC, na sigla em inglês) cortou o compulsório bancário em 25 pontos-base, aumentando a liquidez no sistema financeiro com o objetivo de garantir crédito para apoiar o crescimento econômico, segundo comunicado do Banco. O PBoC tem mantido inalteradas as taxas de juros da economia.

Na maioria dos países do leste asiático, excluindo China, importantes elos na cadeia de suprimento global, os PMIs de manufaturas diminuíram moderadamente, e continuaram fracos, sinalizando leve contração ou expansão moderada em março.

Cenário Doméstico

Atividade

Os efeitos da pandemia sobre a economia estão superados. O desempenho da atividade nos últimos dois anos foi sólido: o PIB cresceu 5% em 2021 e 2,9% no ano passado. Apesar da expansão no ano, houve forte desaceleração no segundo semestre de 2022. Após registrar uma alta moderada de 0,3% no 3T22, o PIB do 4T22 contraiu 0,2% frente ao trimestre anterior.

As condições que possibilitaram o sólido resultado para 2021 e para o primeiro semestre de 2022 não estão mais presentes. A taxa Selic em território contracionista já afeta a atividade – os dados mostram sinais de enfraquecimento, mas menos intenso do que o esperado. A desaceleração do crescimento global impacta a atividade doméstica. Os altos preços de commodities, que beneficiaram o Brasil no primeiro semestre do ano passado, já mostram reversão.

Os efeitos da política monetária contracionista e da desaceleração global devem se estender ao longo de 2023 e de 2024. No entanto, alguns fatores estão impulsionando o crescimento para o PIB deste e do próximo ano. Além dos estímulos fiscais e da estimativa de uma safra recorde de soja para 2023, que já havíamos comentado, dados correntes um pouco mais fortes do que o esperado e a perspectiva de queda antecipada da Selic a partir de setembro devem ajudar. Para o 1T23, projetamos forte alta de 1,8% em relação ao trimestre anterior, puxado por agropecuária. Para o ano de 2023, revisamos nossa projeção de crescimento do PIB de 1% para 1,5%. Os riscos advindos do cenário global arrefeceram. Para 2024, revisamos a projeção de crescimento do PIB de 0,5% para 1%, devido à redução antecipada da Selic.

A taxa de desemprego já se encontra ao redor do seu nível neutro ou um pouco abaixo. O crescimento abaixo do potencial nos leva a projetar uma leve alta da taxa de desemprego até final de 2024.

Fiscal

O resultado primário do setor público consolidado encerrou o ano de 2022 com um superávit de 1,3%, um resultado positivo pelo segundo ano consecutivo. Ao longo do ano passado tivemos surpresa positiva na arrecadação, puxada por preços de commodities elevados, além de receitas extraordinárias pontuais.

Neste ano, devemos voltar a ter déficit primário. A PEC da Transição, aprovada no Congresso, sinaliza um aumento de gastos relevante para 2023, mas a divulgação do novo arcabouço fiscal e as medidas de aumento de arrecadação, caso confirmadas pelo Congresso, devem atenuar a deterioração das contas públicas. Revisamos nossa previsão de déficit para o setor público consolidado para 2023 de 1,4% para 1%, incorporando parte das medidas anunciadas. Pelo mesmo motivo alteramos nossa projeção para 2024 que passou de déficit de 1,2% do PIB para déficit de 0,7%.

A dívida líquida encerrou o ano de 2022 em 57,1% do PIB e deve continuar subindo em 2023 e 2024, puxada pela perspectiva de juros ainda elevados, pelo crescimento moderado do PIB e pelo aumento de gastos. Nossa expectativa para a dívida líquida de 2023 passou de 60,9% para 60,8% do PIB ao final do ano. Para 2024, a projeção da dívida líquida passou de 65,2% para 62,1%.

A situação fiscal brasileira é desafiadora e requer um forte ajuste para equilibrar as contas públicas. Apesar de o novo arcabouço ser um passo importante na direção da sustentabilidade das contas públicas, acreditamos que, na ausência de um significativo aumento na arrecadação, ele deverá ser insuficiente para impedir o crescimento da dívida do país.

Setor externo

Acreditamos que o atual nível do câmbio em patamares historicamente elevados esteja alinhado com os fundamentos da economia, principalmente considerando os riscos fiscais. A taxa de câmbio possui forte correlação com a dívida líquida do setor público.

A taxa de câmbio fechou o ano de 2022 em R$ 5,28. Continuamos acreditando que a piora da trajetória da dívida líquida do governo e o dólar ainda em patamar historicamente valorizado frente às demais moedas são fatores que devem sustentar a depreciação do real. No entanto, nos últimos meses o dólar perdeu valor contra as principais moedas globais e o real acompanhou este movimento. De outubro de 2022 até hoje o real valorizou frente ao dólar cerca de 7%, mas ficou praticamente estável em relação a uma cesta de moedas de países emergentes. A perspectiva de um dólar um pouco mais fraco globalmente do que o projetado anteriormente nos fez revisar a taxa de câmbio para o final deste ano de R$ 5,60 para R$ 5,30. À frente, a taxa de câmbio deve continuar depreciando influenciada principalmente pela elevação da dívida. Projetamos dólar em R$ 6 ao final de 2024.

Com relação às contas externas, as importações em patamar elevado, apesar da taxa de câmbio depreciada, contribuíram para um saldo negativo de US$ 56 bi das transações correntes em 2022. Para 2023, ajustamos a projeção de déficit de US$ 67 bi para US$ 60 bi. Para 2024, estimamos um déficit de US$ 50 bi.

Inflação

O IPCA de 2022 registrou alta de 5,8%. A forte elevação de preços em 2021 de 10,1% impactou a inflação do ano passado via inércia. Por outro lado, as reduções de impostos aprovadas reduziram a inflação em quase 3 pontos percentuais. Acreditamos que à frente a inflação irá continuar alta e desacelerar de forma gradual.

A dinâmica inflacionária mostra queda do IPCA no acumulado em 12 meses, influenciada principalmente pela forte redução dos bens monitorados. A inflação de bens industriais mostra sinais claros de desaceleração, ao mesmo tempo em que as deflações nesse mesmo segmento, nos preços de atacado, nos dão conforto sobre a continuação dessa trajetória. A inflação de serviços já ultrapassou seu pico, mas segue elevada e resiliente. Acreditamos que ela deve continuar elevada nos próximos meses em função da inércia inflacionária. Para o IPCA como um todo, as últimas divulgações e a revisão da taxa de câmbio para baixo, tiveram impactos baixistas. No entanto, esses fatores foram inteiramente compensados pela mudança na forma de cobrança do ICMS para gasolina e etanol, que agora passam a ter uma alíquota fixa por litro. Com isso, mantivemos nossa projeção de IPCA de 2023 em 6%.

Para 2024, acreditamos que a inflação irá continuar caindo a passos lentos. Diante da sinalização do governo da necessidade de reduzir juros e de que a meta de inflação de 3% não estaria bem ajustada, passamos a incorporar no cenário metas mais elevadas, de 4,5%, de 2024 em diante. Essa mudança seria implementada em junho, quando o Conselho Monetário Nacional (CMN) se reúne para definir a meta de 2026, podendo também revisar as metas dos anos anteriores. Elevamos nossa projeção para o IPCA de 2024 de 5% para 5,5%. Importante reiterar que apesar da diminuição da incerteza em relação ao arcabouço fiscal, os riscos associados às contas públicas seguem impondo desafios à trajetória da inflação à frente.

Política monetária

O Copom (Comitê de Política Monetária) iniciou um ciclo de alta de juros em março de 2021. Na última reunião, em março, o Comitê manteve a taxa Selic em 13,75% e afirmou que “segue vigilante, avaliando se a estratégia de manutenção da taxa básica de juros por período prolongado será capaz de assegurar a convergência da inflação”.

A projeção de inflação do BCB no cenário de referência passou de 5,6% para 5,8% para 2023 e de 3,4% para 3,6% para 2024. Este cenário supõe trajetória de juros que diminui de 13,75% para 12,75% até o final de 2023, para 10% ao final de 2024 e para 9% ao final de 2025. O Comitê “optou novamente por dar ênfase ao horizonte de seis trimestres à frente, referente ao terceiro trimestre de 2024”. A projeção para o IPCA deste período no modelo do BCB passou de 3,6% para 3,8%. Ou seja, as projeções de inflação se elevaram para todos os horizontes mencionados.

O Comitê continuou dando ênfase à elevação das expectativas de inflação, em especial as de prazos mais longos. No entanto, o Comitê reconheceu a redução da incerteza fiscal. De acordo com o texto, “a recente reoneração dos combustíveis reduziu a incerteza dos resultados fiscais de curto prazo. Por outro lado, a conjuntura, marcada por alta volatilidade nos mercados financeiros e expectativas de inflação desancoradas em relação às metas em horizontes mais longos, demanda maior atenção na condução da política monetária”.

O Comitê publicou as projeções para inflação em um cenário alternativo, no qual a taxa Selic é mantida constante ao longo de todo o horizonte relevante. As projeções neste cenário passaram de 5,5% para 5,7% ao final de 2023, de 3,1% para 3,3% para o terceiro trimestre de 2024 e de 2,8% para 3% para o final do ano de 2024.

Na nossa visão, o Comitê busca sinalizar que a manutenção da taxa de juros no patamar atual de 13,75% por um período prolongado – até o final de 2024 – seria compatível com a convergência da inflação para a meta no horizonte relevante de política monetária. No entanto, passamos a incorporar no nosso cenário a definição, em junho, de uma meta de inflação de 4,5% para 2026, acima da atual de 3%. A meta de 2025 também deve ser ajustada para cima de maneira a suavizar a atuação da política monetária. Na nossa visão, essa mudança abre espaço para um corte de juros antecipado, a partir de setembro deste ano.

Revisamos a projeção de Selic de 13,75% para 12,5% ao final de 2023. Para 2024, revisamos a projeção de Selic de 12% para 11% ao final do ano.

Projeções macroeconômicas do C6 Bank

20192020202120222023P2024P
Atividade
Crescimento Real do PIB1,2%-3,3%5,0%2,9%1,5%1,0%
PIB Nominal (R$ bi)7.3897.6108.8999.91510.75811.462
Fiscal
Resultado Primário (% PIB)-0,8%-9,2%0,7%1,3%-1,0%-0,7%
Resultado Primário (% PIB)54,7%61,4%55,8%57,1%60,8%62,1%
Dívida Bruta (% PIB)74,4%86,9%78,3%72,9%77,8%81,8%
Setor Externo
R$/US$ (final de período)4,035,205,585,285,306,00
Balança Comercial (US$ bi)273236443743
Conta Corrente (US$ bi)-68-28-46-56-6050
Conta Corrente (% PIB)-3,6%-1,9%-2,8%-2,9%-3,0%-2,5%
Inflação
IPCA (Var. a/a)4,3%4,5%10,1%5,8%6,0%5,5%
Juros
Selic (dez)4,50%2,00%9,25%13,75%12,50%11,00%
P=Projeção
Fontes: IBGE, BCB, Bloomberg, C6 Bank.

Equipe Econômica C6 Bank

Felipe Salles                   Head

Claudia Moreno      Head Brasil

Claudia Rodrigues    Head Internacional

Felipe Mecchi               Internacional

Heliezer Jacob             Brasil

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